Se você está lendo este artigo, provavelmente OKR não é novidade para você. E se você está tendo sucesso com OKR, parabéns! Eu adoraria saber sobre seus aprendizados. 

Por outro lado, se você sente que ainda não colheu os benefícios prometidos por OKR, ou OKR está sendo uma iniciativa frustrada para sua organização, espero que o que irei compartilhar a seguir te ajude de alguma forma. E que este não seja somente mais um dos 30 milhões de artigos listados ao buscar por “OKR” no Google. 

As origens de OKR

No livro Measure What Matters (Avalia o que importa, em Português), o icônico John Doerr compartilha a história de OKR. Se você quer saber como surgiu OKR, esta é sem dúvidas uma leitura obrigatória. 

Porém, eu quero destacar uma passagem interessante do livro. Em um dos encontros que Doerr teve com Larry Page e Sergey Brin (fundadores do Google) nos estágios iniciais da empresa, ele lhes explicou o que era OKR, dando a seguinte definição para Objectives e Key Results (tradução livre):

 “Um OBJETIVO… é simplesmente O QUE deve ser atingido, nada mais e nada menos. Por definição, objetivos são significativos, concretos, orientados à ação e (idealmente) inspiracionais”.

 “KEY RESULTS monitoram COMO chegamos ao objetivo. KRs eficazes são específicos e temporais, agressivos porém realistas. Acima de tudo, eles são mensuráveis e verificáveis.”

Doeer então fornece o exemplo abaixo no livro:

OBJECTIVE:

Build a planning model for their company

KEY RESULTS (AS MEASURED BY…):

  • KR #1: Finish the presentation on time.
  • KR #2: Create a sample set of quarterly Google OKRs.
  • KR #3: Gain management agreement for a three-month OKR trial.

 

Como OKR mede o que importa?

Ao ler este exemplo, percebi que ele conflitava com as definições de Objective e Key Result citadas acima. A primeira pergunta que eu me fiz ao ler este OKR foi: 

 “Este OKR está realmente medindo o que importa?”

Bem, naquele momento do Google, com tantas ideias de produtos e tantas alternativas de experimentos na mesa, talvez priorizar atividades era tudo que eles precisavam. E é exatamente isso que este OKR acima está fazendo.

Juntamente com este exemplo, uma enorme quantidade de exemplos de OKR em milhões de blogs (especialmente em blogs de softwares de gestão de atividades e projetos) seguem um mesmo padrão - são orientados a ação (tarefas, iniciativas, projetos, etc.) e atingimento de milestones (um dos principais elementos da gestão tradicional de projetos). 

Aqui está outro exemplo de OKR da Intel criado na época de Andy Grove (considerado o pai de OKR):

OBJECTIVE:

Demonstrate the 8080’s superior performance as compared to the Motorola 6800

  • KR1: Deliver five benchmarks
  • KR2: Develop a demo
  • KR3: Develop sales training materials for the field force
  • KR4: Call three customers to prove the material works

Novamente, o exemplo acima não está medindo o que importa. Neste caso, OKR está sendo utilizado como uma ferramenta de gerenciamento de atividades, embora Doerr cite no livro a regra que, na minha visão, é a principal para começarmos a criar bons Key Results:

“Não é um Key Result a menos que ele tenha um número” - Marissa Mayer

Andy Grove e John Doerr estão entre os maiores líderes de negócios de todos os tempos. Então, quem sou eu para criticar os OKRs publicados por eles? 

Acontece que, OKR, assim como outras disciplinas, evoluiu com o passar dos anos. Na época que OKR surgiu na Intel não havia maturidade em frameworks e métodos de gestão de atividades como hoje. Pense em PMBOK, PRINCE2, Scrum, Kanban, etc…

Muitos dos exemplos do livro foram criados antes da era da Internet e Mobile. Com a rápida evolução tecnológica e a comoditização da informação, passou a ser crucial ter mecanismos para mensurar elementos mais complexos dos negócios como a satisfação e o comportamento de clientes nos nossos produtos e serviços em tempo real.

Juntamente com a modernização da disciplina de gestão de produtos digitais, temos hoje uma linha mais moderna de OKR, menos focada em mensurar esforço e buscando um planejamento baseado em benefícios mensuráveis para o negócio, clientes e colaboradores.

Mesmo com a ampla adoção de métodos ágeis nos últimos anos, ainda vemos todos os dias líderes obcecados por mensuração de entregas e aumento da velocidade dos times. 

Muitos líderes ainda estão inconscientes do fato de que velocidade na direção errada é desperdício. Alguns até estão cientes, mas são mensurados por volume de entregas, direcionando comportamentos muitas vezes nocivos no ambiente de trabalho.

 Key Results como os abaixo infelizmente ainda são comuns:

  • Entregar 90% dos story points na próxima release
  • Aumentar a quantidade de itens entregues por semana (throughput) de X para Y

Sim, isso é triste. E como já dizia Goldratt:

Diga-me como você vai me medir, e então eu lhe direi como vou me comportar. Se você me mede de maneira ilógica, não reclame de comportamento ilógico. — Eli Goldratt

Para muitas organizações, OKR é uma grande perda de tempo por um simples fato: não reconhecer a diferença entre atividades, outputs e outcomes e não gerenciar esses 3 elementos de formas distintas.

OKR é sobre foco em obter melhores resultados (outcomes). Mas o que é outcome? Por que essa palavra está sendo cada vez mais usada para dar mais agilidade e eficácia no gerenciamento de produtos e serviços?

A diferença entre Outcomes, Outputs, Atividades e Inputs no Terceiro Setor

Ultimamente, o termo outcome tem sido usado cada vez mais, principalmente na gestão de produtos digitais. No entanto, uma das principais origens desse termo vem do terceiro setor.

Definição de Terceiro Setor:

Segundo o escritor e antropólogo Rubem César Fernandes,

“...o terceiro setor é formado por organizações privadas da sociedade civil que possuem finalidades sociais públicas, distinguindo-se assim tanto dos órgãos do setor estatal (o chamado primeiro setor que têm como finalidade a gestão de políticas públicas), quanto das empresas privadas (o segundo setor, que têm como finalidade principal a geração de lucro para seus proprietários e acionistas).

Segundo Fábio Ribas, fundador da Prattein e especialista em políticas, programas e estudos na área do desenvolvimento social,

“...organizações do terceiro setor não têm fins lucrativos e podem contribuir de forma significativa para o desenvolvimento da sociedade. São organizações privadas, mas têm finalidade pública. Questionam a rigidez da divisão da sociedade entre Estado e Mercado e focam na necessidade da construção de sociedades mais justas, equilibradas e sustentáveis." 

Portanto, este setor da economia a muito tempo já faz na sua gestão uma distinção importante entre 3 elementos distintos:

  • Inputs
  • Atividades e Outputs
  • Outcomes e Impacto

A seguir um breve resumo sobre cada um dos elementos (fonte: www.oecd.org):

Inputs

Inputs são os recursos utilizados para realizar as atividades, sejam eles financeiros, organizacionais, humanos ou materiais. Exemplos:

  • Budget
  • Assistentes sociais
  • Computadores, servidores, salas de aula
  • Medicamentos

Atividades

Atividades é um termo “guarda-chuva” utilizado aqui para representar processos, ações ou eventos realizados por meio dos quais inputs são mobilizados para produzir saídas específicas. Exemplos:

  • Elaboração do design de uma nova página do site do projeto
  • Impressão do material didático para os alunos
  • Troca de um equipamento com defeito
  • Elaboração de plano de mentoria para recém-formados

Outputs

Outputs são os produtos criados ou serviços fornecidos diretamente a partir das atividades realizadas. Outputs em geral representam volume de entrega.

  • Criação de 10 campanhas de marketing digital
  • Treinamento para 5 novos cirurgiões
  • Toda a equipe treinada no método Kanban

Inputs, atividades e outputs são elementos sobre os quais temos controle. O mesmo não acontece com outcomes.

Outcomes

Outcomes são as mudanças esperadas como resultado das atividades realizadas. É o efeito ou a consequência desejada. 

Eles representam mudanças desejadas no comportamento de pessoas ou clientes, nos relacionamentos, ações, habilidades ou conhecimentos. Podemos influenciar os outcomes, mas não temos controle direto sobre eles. Exemplos:

  • 10% de aumento na visita das clínicas de saúde
  • 20% de redução no-shows de consultas médicas
  • 30% mais pessoas declararam que estão com uma melhor qualidade de vida
  • 25% de aumento na quantidade de alunos que obtiveram um emprego na sua área de formação

Desta forma, na linguagem dos projetos sociais do terceiro setor, o planejamento baseado em outcomes é uma abordagem de planejamento, monitoramento e avaliação que coloca as pessoas no centro (impacto social), define os resultados como mudanças de comportamento e ajuda a medir a contribuição para processos complexos de mudança.

A W.K. Kellogg Foundation, por exemplo orienta que os líderes façam as seguintes perguntas para avaliar seus outcomes em projetos sociais:

  • Quais são os resultados críticos que você está tentando alcançar?
  • Que impacto o projeto está tendo nas pessoas, na sua equipe, na sua organização e na sua comunidade?
  • Que impacto inesperado o projeto teve?

Você percebe como as mesmas perguntas se aplicam no nosso mundo de tecnologia e produtos digitais?

Essa “cadeia de resultados” pode ser ilustrada na imagem abaixo:

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Outcomes vs Outputs em OKR: Como fazer boas perguntas para definir OKRs baseados em Outcomes?

Na linguagem moderna de OKR, os Key Results representam outcomes, ou seja, benefícios mensuráveis para o negócio, clientes e colaboradores.

Quando seguimos esta definição, aumentamos muito a probabilidade de OKR se tornar algo útil, que gera um senso de propósito no trabalho, além de foco, alinhamento e agilidade.

Muitas vezes, tudo que as pessoas precisam para sair da obsessão por atividades e identificar bons outcomes é alguém que faça boas perguntas.

Certa vez um cliente (e-commerce de moda infantil) me pediu para avaliar um de seus OKRs, pois acreditava que ainda não estava bem elaborado. UM dos OKRs que eles me mostraram foi seguinte:

OBJECTIVE:

Tornar o nosso produto o melhor do mercado

KEY RESULTS:

  • Lançar 15 novas features
  • Realizar 12 melhorias de usabilidade no produto

Quando eu vi esse OKR, eu tinha duas alternativas para tentar ajudar.

Alternativa 1: demonstrar a minha expertise fazendo uma crítica ao OKR:

 “Isto não é um OKR, pois Lançar Website é nitidamente uma atividade e esses Key Results são outputs (volume de entrega)”.

Alternativa 2: engajar com eles em um processo criativo de conversação para ajudá-los a refletir por conta própria e maximizar a qualidade do seu OKRs.

Ciente de que era importante gerar aprendizado no cliente, optei pela alternativa 2. Segue abaixo um recorte da conversa que tive com eles:

Eu: É muito interessante ver que vocês estão com várias novas ideias para o produto. Ao mesmo tempo, estou curioso para saber qual é a coisa mais importante que precisa acontecer até o final do próximo trimestre. 

Cliente (após algum silêncio): Bom, precisamos muito tornar o processo de compra mais fluido para o cliente. 

Eu: Até o final do trimestre, como você saberia se essa fluidez melhorou?

Cliente: Olhando os dados, podemos dizer que precisamos aumentar a conversão do nosso carrinho de compras.

Eu: O que seria um aumento desafiador e realista ao mesmo tempo?

Cliente: Acredito que um aumento de 15%.

Eu: OK, como você pode medir isso?

Cliente (após alguma discussão entre os membros da equipe): Na verdade, um aumento de 20% nos produtos para crianças de 0 a 3 anos seria uma boa ideia. Assim podemos focar nas melhorias para este segmento e colher feedback mais rápido.

O diálogo acima (trecho simplificado) ajudou o grupo a chegar a um Key Result mensurável, específico e desafiador, e que fazia sentido (senso de propósito) para todos os membros da equipe.

Continuamos a conversa e, ao invés de ter 27 outputs no OKR (funcionalidades e melhorias), eles conseguiram definir outros 2 Key Results (outcomes) para o trimestre, além de re-priorizar seu backlog e roadmap de produto de acordo com o OKR, aumentando seu foco e produtividade.

Além disso,  devido ao foco, foram capazes de reduzir a quantidade de atividades simultâneas (Work In Progress) e, consequentemente, a sobrecarga da equipe.

Conclusão

OKR é uma ferramenta poderosa para aumentar a agilidade, o foco e o alinhamento de uma organização. No entanto, apesar de simples, não é fácil. Três coisas são importantes para obter os benefícios reais dessas superpotências organizacionais:

Primeiro, evite usar o OKR como uma ferramenta de gerenciamento de atividades. Deixe isso para os métodos e estruturas de gerenciamento de atividades.

Em segundo lugar, sempre procure identificar os resultados ao elaborar seus OKRs. Nem sempre será fácil. Os chamados “Key Results de milestone” são tentadores, mas uma maneira bastante preguiçosa de definir OKRs.

Por fim, no período dedicado à definição dos OKRs para o próximo ciclo, reserve um tempo com o pessoal do produto/serviço para conversar e fazer boas perguntas durante o processo. Ótimos OKRs não são construídos em 15 minutos e requerem tempo, análise e liderança.

Desejo-lhe sucesso em sua jornada com OKR.

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